sábado, 2 de setembro de 2017

Denúncia: “Estão tirando os mortos das gavetas sem comunicar as famílias”

Fonte: Jornal do Pampa

O Cemitério Municipal foi assunto na última sessão plenária da Câmara de Vereadores, quando Marquinho Vivian (PMDB) apresentou um pedido de informação solicitando cópia dos ofícios ou autorizações da Secretaria de Assistência Social referente a liberação de túmulos nº  102, 77 e 1136 no Cemitério Municipal por parte da secretaria bem como documentação relativa a estes túmulos arquivadas na Secretaria de Obras.
Em sua fala, Marquinho afirmou que irá aguardar o prazo de 30 dias que o Executivo tem enviar a resposta ao Legislativo, para depois voltar a se manifestar, mas ele destacou que recebeu denúncias e o caso é grave. “Não quero acreditar nisso, mas já não duvido de mais nada. A denúncia que recebemos é que estão tirando os mortos das gavetas, sem comunicar as famílias para poder enterrar mais gente. Existem documentos da Assistência Social para o Cemitério, para fazer a remoção, sem comunicar os familiares que ali estão. Vamos aguardar estas informações e respostas. Até então o Cemitério é de responsabilidade da Secretaria de Obras. É um assunto delicado e preocupante, existem relatos, está comprovado, vamos aguardar os ofícios e depois voltar neste assunto”.
O Cemitério Municipal conta com aproximadamente 400 gavetas, destas 154 são utilizadas pelo município para aluguel, nove são destinadas para indigentes e 20 são de propriedade do asilo. Todas as gavetas estão ocupadas. As gavetas destinadas aos indigentes, possuem uma identificação, com uma tinta azul que diz “IND”, porém em algumas destas que estão marcadas há até lápide, com foto, nome, data de nascimento e morte da pessoa.
O local conta com o serviço de limpeza e conservação que é exercido por três zeladores e um chefe da zeladoria, Jocenir da Rosa, que atualmente está afastado por motivos de saúde, por tempo indeterminado.
Sobre o caso, os zeladores afirmam que foram feitas trocas nas gavetas e as famílias não foram avisadas, eles confirmam que o documento teve origem da Secretaria de Assistência Social solicitando que fossem feitos os enterros. No documento não consta número de gaveta que seria aberta. “Em 15 dias, três gavetas foram mexidas. A nosso ver, é preciso chamar a família, se não achou é só usar o rádio, o jornal, ou até mesmo a Câmara de Vereadores para aprovar a exumação. Não se pode mexer nas gavetas. Isso, na verdade, foi uma violação de túmulo, não notificaram as famílias, nenhuma mídia chamou, não foi feita uma busca na Secretaria da Fazenda para ver a situação que estava. Não sabemos qual foi o critério utilizado para abrir aquelas gavetas”.
“Se falarem que nós nos recusamos a fazer este serviço, nós nos recusamos mesmo. Violação de túmulo não é com nós. Se eles falarem que nós não ajudamos, não ajudamos mesmo. Não fomos nem olhar. Não é da nossa função, mas nós fazemos os enterros, para que tudo esteja funcionando no cemitério e não gerar atritos”, ponderando que são zeladores e não coveiros. “Nós continuamos fazendo os enterros, porque as famílias quando chegam aqui precisam e não tem culpa de nada, portanto mantemos em ordem os serviços que chegam aqui”.
Sobre as atribuições dos zeladores, consta no plano de carreira “promover a limpeza e conservação dos cemitérios municipais”, seguido de “promover o alinhamento e numeração das sepulturas e de signar lugares onde se devam abrir novas covas; manter o registro das sepulturas, registrado em livro próprio; realizar sepultamentos abrindo e fechando covas e túmulos; proceder a limpeza e conservação do mesmo; e atividades afins”. O Secretário de Obras, Paulo Henriques, destaca que atividades como exumação se enquadra nesta última.
Sobre os funerais de indigentes, os zeladores comentam que a ordem de serviço parte da Secretaria de Assistência Social, que é responsável pelos cadastros de pessoas carentes e também pela busca de familiares, no caso, quando a pessoa morre e não tem nenhuma identificação.
O chefe da zeladoria, Jocenir da Rosa falou sobre os projetos de melhorias no Cemitério Municipal. “Serão colocadas câmeras, o vandalismo caiu 90% e a população voltou a ter o direito de chegar no que é seu. O saneamento do entorno foi reformado e também há um projeto de arborização”. Sobre as aberturas das gavetas, Rosa conta que os corpos que estavam na gaveta, foram realocados em um saco e as gavetas ficaram compartilhadas.
“As gavetas foram abertas, conforme a ordem de serviço e o espaço está compartilhado, os restos mortais estão no mesmo local, na mesma gaveta. Não foi retirado dali, o espaço apenas foi dividido. A consciência está tranquila, tudo foi feito conforme ordem de serviço e documentos”, afirmou o chefe da zeladoria, que comentou ainda que os servidores possuem todo o equipamento necessário para trabalhar. “Os servidores têm a sua disposição todo o equipamento necessário: luva, álcool, repelente, kit de primeiros socorros e roupas adequadas para dia de chuva”.
O Secretário de Obras, afirmou que o serviço no Cemitério Municipal não foi interrompido e tudo está correndo dentro da normalidade. A cada três anos os familiares tem uma taxa para pagar, porém a Secretaria de Obras não tem um controle do que está pago e da inadimplência. Os pagamentos são feitos na Secretaria da Fazenda. “A Secretaria de Obras entende que a pessoa que alugou uma gaveta, tem o compromisso de procurar e fazer o pagamento, porque a pessoa tem ciência do custo, inclusive fica uma dívida ativa no município”, afirmou Henriques.
“A Secretaria de Obras tem um controle com datas de vencimento, quando vence os três anos, mas a pessoa não recebe nenhum tipo de notificação, boleto ou carta. Será feito um recadastramento e um mapeamento de todo o cemitério”, disse o chefe da zeladoria.
As taxas que envolvem o Cemitério Municipal são: aluguel de gavetas R$ 48,60 a cada três anos; abertura e fechamento R$ 32,30; remoção entrada e retirada R$ 26,20; licença para construção de capela R$ 48,60; perpetuidade (m²) R$ 163,70.
Sobre a indicação de aumentar o número de gavetas, apresentado pelo vereador Ricardo Rosso, o secretário de obras afirmou que é preciso fazer um estudo devido a estrutura do local.
“Quando é caso de indigente é a Assistência Social que é encarregada. Todo o procedimento de capela, gaveta e sepultamento é com a outra secretaria”, explica o Secretário de Obras que acrescenta que a capela, cozinha e banheiros do Cemitério também são de responsabilidade da Assistência Social. Sobre o caso das três gavetas, Henriques salienta que a ordem de serviço partiu da Assistência Social. “Está tudo documentado, conforme a lei”.
A Secretária de Assistência Social, Maria Teresa Macedo, explicou que “indigente” é aquela pessoa que não tem condições que está em situação de vulnerabilidade, não é carente. “Foi o caso dos últimos três que faleceram. Quando não se tem condições, e isso é comprovado através dos cadastros, o município enterra. Em alguns casos a família aparece depois, porque fazemos um trabalho de busca ativa”.
Maria Teresa afirmou ainda que o município tem poucos lugares e todas as gavetas estão ocupadas. “Quando acontece um caso de morte de indigente, a primeira coisa que fazemos é buscar a família, entra-se em contato com o Cemitério, sendo que tudo é documentado, para os procedimentos funerários, e depois continua a busca pelos familiares”, explica.
Sobre violação de túmulos, a secretária afirma que os três casos não configuram isso. “Foi um procedimento normal. Passando o tempo necessário, é preciso juntar e compartilhar o espaço, que é limitado”. Sobre as gavetas que foram mexidas a secretária disse que os familiares não foram encontrados. “Muitas vezes a família também não busca”.
A Secretaria de Assistência Social não divulgou os nomes dos corpos que estavam nas gavetas e nem dos que foram colocados no local.
O promotor de justiça de Caçapava do Sul, Diogo Taborda, afirmou que o Ministério Público irá abrir investigação para uma análise do fato e uma análise jurídica deste fato para ver se existe a responsabilidade de alguém no caso. “Em tese pode haver improbidade administrativa e pode ter crime, mas em tese, por isso será aberta a investigação, para analisar as circunstâncias do fato e as jurídicas para verificar se existe algum ato ilegal, e se for o caso, buscar sua responsabilização. Como há indícios de ilicitude, o Ministério Público tem o dever de investigar”.

O que diz a lei
Os artigos 210 e 211 do Código Penal tratam do crime de violação de sepultura e delito de destruição, subtração ou ocultação de cadáver. No art. 210 também, protege-se o sentimento de respeito pelos mortos. Com relação ao objeto material, a lei faz menção a sepultura ou urna funerária. Tal delito consuma-se com a violação ou profanação de sepultura ou urna funerária. Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada. Já o art. 211 do Código Penal tem como pena a reclusão de um a três anos e multa. O cadáver ou parte dele é o objeto material de tal delito. Consuma-se o crime com a destruição total ou parcial do cadáver. Trata-se de crime de ação penal pública incondicionada.


Por Carol Petrin – MTE 17.708/RS

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